Sim, sei que gostas do que vês. Percebe-se isso pela forma como me olhas de cima a baixo enquanto um sorriso aflora aos teus olhos.
Mas o que estás a ver é apenas o invólucro. O melhor de mim está mesmo lá dentro. Protegido, reservado só para algumas pessoas, aquelas que querem realmente saber quem eu sou e o que me move. Aquelas que se interessam e querem ver o que está para lá do meu simples exterior.
E se queres mesmo conhecer-me, atreve-te.
Atreve-te a olhar bem fundo nos meus olhos, porque às vezes eles dizem mais do que os meus lábios.
Atreve-te a ouvir-me, a encontrar no tom da minha voz as subtilezas que denunciam as minhas paixões e os meus desapontamentos.
Atreve-te a tocar-me, pois só assim te aperceberás da temperatura da minha pele.
Atreve-te a dar-me a mão e deixa que eu te leve a descobrir paisagens infinitas, templos escondidos e sorrisos com alma.
Atreve-te a conhecer as minhas memórias e os meus sonhos, porque o passado é a lava que me moldou e o futuro a opala em que estou a transformar-me.
Atreve-te a fazeres de mim o teu livro de cabeceira.
Caí de quatro quando o vi. Como se tivesse sido fulminada por um raio. Fiquei pregada ao chão, mesmerizada, incapaz de raciocinar. Aplicam-se a mim todos os lugares-comuns habituais para descrever uma paixão à primeira vista. E provavelmente mais alguns que ainda não foram usados.
Não foram os olhos dele, tapados por óculos escuros. Também não foi o corpo, disfarçado pelas roupas meio largas, nem foram as mãos, escondidas nos bolsos das calças.
Terá sido talvez o seu sorriso, luminoso e quente como um dia de Verão. Ou tão só a sua presença, a sua aura de confiança, a forma como entrou e ficou a olhar. Simplesmente a olhar e a sorrir.
A partir desse momento, tudo à minha volta como que se esbateu, e fiquei incapaz de afastar os olhos dele. Como se ele fosse o pólo norte da minha agulha magnética, o farol que rompe a escuridão do oceano onde eu navegava, ele planeta principal e eu apenas um satélite gravitando em seu redor. Apaixonei-me sem razão, sem controlo e sem sequer me aperceber. Desapareceram todas as minhas prioridades, porque o meu único objecto de desejo passou a ser ele, um simples desconhecido, um estranho cuja existência até então eu ignorava completamente e de quem nada sabia.
Foi assim que me apaixonei sem remédio e me deixei afogar naquela paixão. Deixei-me ir até ao fundo, privada de qualquer possibilidade de salvação, porque contrariar o que sentia teria sido impossível, mesmo que quisesse. Deixei que a paixão me esvaziasse, me consumisse até já nada restar de mim. Apenas sobreviveram as cinzas do que eu tinha sido.
E só nessa altura, qual fénix, eu pude renascer. Porque esta paixão foi como a chama de um fósforo – começou com uma explosão, mas ardeu rapidamente até ao fim, e nada sobrou para a alimentar. Aqueceu-me o coração por algum tempo, ofereceu-me um novo fôlego, e dela saiu uma mulher renovada e mais forte.
Há poucas coisas melhores do que o final de uma tarde quente de Verão.
Chegar a casa e descalçar os sapatos, sentir a frescura que sobe do chão, fechar a porta e ficar por uns momentos na penumbra, respirar fundo.
Abrir as janelas do quarto de par em par e fazer a cama de lavado, cheirar o aroma a amaciador dos lençóis, a brisa morna que vem da rua agita os cortinados enquanto ando em volta da cama.
Encher de água um regador plástico colorido e alimentar a terra já seca das plantas que habitam os vasos do alpendre.
Tomar um duche pouco quente com a janela entreaberta, passar a toalha ao de leve pelo corpo para ficar com a pele ainda húmida, que o calor vai acabar de a enxugar em poucos minutos.
Depois sentar-me na varanda com um livro, deixar o cabelo secar ao ar livre, o sol descendo devagarinho até pousar no telhado da casa em frente e a seguir desaparecer.
O jantar é ligeiro e termina com um gelado fresco e macio, um dos meus CDs favoritos gira no leitor e fornece a banda sonora perfeita, enquanto o crepúsculo pinta de laranja e rosa o horizonte.
Este é um blog recente, mas que promete. Gostei dos posts que já estão publicados, estão bem escritos e têm conteúdo – o que não é assim tão habitual quanto isso, pelo menos entre os bloggers não profissionais.